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De família humilde para o estrelato, conheça Arlindo Júnior, o Pop da Selva

Arlindo Júnior em 1996 pelo Boi Caprichoso. Foto: Andreas Valentin

O Festival Folclórico de Parintins é considerado a maior manifestação folclórica do Amazonas, no entanto, antes de ser o que conhecemos hoje, ele passou por algumas mudanças e o cantor Arlindo Júnior foi um dos responsáveis dessas proezas.

Nascido no dia 20 de maio de 1968, Arlindo Júnior veio de uma família bem humilde. Aos 12 anos de idade ajudava o pai a vender peixe para o sustento da família. Ele iniciou a carreira quando se apresentou em um show de calouros apresentado por Zezinho Corrêa, que mais tarde seria vocalista da banda Carrapicho.

Sem nunca ter viajado na vida, Arlindo Júnior conheceu Parintins, a 365 quilômetros de Manaus, no ano de 1989, a convite do amigo e músico Jamilson Rossete.

Arlindo ficou encantado com a cidade e disse que foi “amor à primeira vista”. Ele se hospedou em Parintins por mais duas semanas, voltou para Manaus, pediu as contas do antigo emprego e foi ser repórter em um programa de rádio na Ilha Tupinambarana.

Convite azul e branco

Quando chegou em Parintins, Arlindo Júnior era vocalista de um grupo de pagode chamado ‘Levanta Poeira’. Porém, ele não tinha nenhuma noção da cultura do boi bumbá.

Durante o show em um clube da cidade, um grupo de representantes do Boi Caprichoso o convidou para ser levantador de toadas. Sem pensar duas vezes, Arlindo topou e tornou-se levantador de toadas do Caprichoso em 1989. “Me apaixonei pela torcida e a torcida se apaixonou por mim”, chegou a declarar o cantor.

Interação com a galera

Nos primórdios do Festival de Parintins os expectadores apenas balançavam as bandeiras nas arquibancadas, mas nos primeiros anos de Arlindo Júnior como levantador de toadas do Boi Caprichoso, a situação mudou.

Foto: Divulgação

Sob o comando do cantor, a galera do Boi Caprichoso passou a utilizar os braços balançando de um lado para o outro, produzindo um efeito que até então era novo no festival.

Explosão da toada em Manaus

Grande parte dos admiradores do Festival de Parintins afirmam que a década de 1990 foi a época de ouro do movimento da toada em Manaus. Nessa mesma época, Arlindo Júnior virou protagonista em divulgar o Caprichoso e o festival na capital amazonense.

Em 1992 ele retornou a Manaus e foi convidado para integrar o ‘Movimento Marujada’, uma organização de parintinenses que moram na capital responsáveis pelos eventos do Boi Caprichoso.

TVLândia em Manaus. Imagens: Borges Evandro

Na mesma época começou a ‘TVLândia’, os primeiros passos da toada em Manaus, e Arlindo era a principal atração da festa.

Muitos contam que, para tirar uma foto com o cantor, era praticamente uma missão impossível devido a sua popularidade. “O Arlindo animava a festa, não deixava ninguém ficava parado”, disse o autônomo Carlos Castro.

Início de uma nova era

O Festival de Parintins, ainda nos anos 1990, começou a ganhar projeção internacional, principalmente com o patrocínio de empresas como a Coca-Cola.

Em 1996, o Boi Caprichoso fundou o Conselho de Artes, um grupo de pensadores com a missão de projetar as apresentações do bumbá em atos, como se fosse uma ópera, sob a tutela do escritor e folclorista Simão Assayag.

Membro da primeira formação, o compositor Ronaldo Barbosa, reconhecido por canções como Pesadelo dos Navegantes, Saga de Um Canoeiro e entre outras, contou que o boi na época era muito pequeno e tudo era mais simples.

“Antigamente o boi era feito de uma maneira mais artesanal, era pequeno e tinha poucos departamentos, mas o Simão (Assayag) inovou e passou a implementar coisas novas para o festival”, disse Ronaldo.

Foto: Arquivo/A Crítica

O espetáculo “As Sete Visões Kaniwá” rendeu ao Boi Caprichoso o título de tricampeão, Arlindo Júnior participou da conquista do título. Ele fez diversas aparições, tanto no centro da arena como na galera, na maioria das vezes vestido que nem um colonizador.

A revolução

No ano seguinte, em 1997, Arlindo Júnior revolucionou as apresentações do Festival de Parintins. Ele foi protagonista de um dos momentos mais icônicos do Boi Caprichoso, lembrados até hoje pelos torcedores.

Ele entrou na segunda noite de apresentação em cima do esqueleto de um dinossauro interpretando a toada “Amazônia Quaternária”, de Ronaldo Barbosa, levando a galera azul e branca ao delírio.

Ainda em 1997, o cantor não parou e protagonizou outro momento inesquecível. Pegando a todos de surpresa, Arlindo se vestiu de padre e interpretou a toada “Amazônia, Catedral Verde”, de Ronaldo Barbosa e Simão Assayag, O sigilo da toada e a troca de figurinos ficou marcada na história do festival.

https://www.youtube.com/watch?v=hePWnhQD0rw
Arlindo Júnior cantando ‘Amazônia, Catedral Verde’. Imagem: Rede Amazônica/1997

No ano seguinte, em 1998, Arlindo Júnior passou a defender os itens de apresentador e levantador de toadas ao mesmo tempo. Ele aceitou o desafio e foi campeão nos dois itens.

O Caprichoso sagrou-se campeão daquele festival e Arlindo Júnior repetiu a troca de figurinos e acrescentou encenações durante a apresentação das tribos e da lenda amazônica. A figura do pescador sendo seduzido pela Yara é lembrada até hoje.

Anos 2000

No início dos anos 2000 ele assumiu apenas o posto de apresentador, ficando no cargo até 2004. Mesmo assim, Arlindo protagonizou momentos inesquecíveis.

Durante a terceira noite de apresentação do Boi Caprichoso, em 2000, houve uma queda de energia. Arlindo comandou a galera e todo mundo cantou a plenos pulmões.

Repetindo a dose de 1997, Arlindo pegou todo mundo de surpresa na primeira noite de apresentação do Caprichoso em 2001. Ele entrou na arena interpretando o velho “Pacamão”, sendo ovacionado pela galera. “E eterno me fez seu criador, sou Tupinambá, sou Tupinambarana, sou Parintins”, disse o Arlindo em sua interpretação.

Representação do velho “Pacamão”. Imagens: TV ACrítica/2001

Em 2005 retornou para o cargo de levantador de toadas, mas saiu no ano seguinte.

Retorno em 2014

Em 2014, ano de Copa de Mundo, Arlindo Júnior retorna ao Boi Caprichoso como apresentador. O Pop da Selva dividiu espaço com David Assayag, tornando realidade um sonho antigo da nação azulada.

Batalha contra o câncer

Arlindo Júnior foi diagnosticado com um câncer em 2016, desde então, passou a travar uma intensa batalha contra a doença. Constantemente ele fazia viagens para São Paulo na intenção de se curar.

Depois de quatro anos de muita batalha, Arlindo Júnior faleceu na noite do último domingo (29) aos 51 anos de idade. Ele estava internado em um hospital particular para dar continuidade ao seu tratamento médico.

Últimas homenagens

O corpo de Arlindo Júnior está sendo velado no Centro de Convenções Vasco Vasques, na avenida Constantino Nery, ao lado da Arena Amazônia. A despedida é aberta ao público.

Fãs se despedem de Arlindo Júnior. Foto: Cristian Guerreiro

Na próxima terça-feira (31) ele será levado a Parintins onde deve acontecer um velório nos currais dos bois Caprichoso e Garantido e na Catedral de Nossa Senhora do Carmo Arlindo será enterrado às 14h de terça-feira no Cemitério São João Batista.

Foto: João Paulo Castro

Por João Paulo Castro

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